JOAQUIMTUR HOMENAGEA CORONEL CASCUDO - NOMES DO RN

A biografia de um potiguar ilustre
Estou aqui com esta bela edição do livro Coronel Cascudo – O Herói Oculto, de Anna Maria Cascudo Barreto, EDUFRN, 270 páginas, sem preço definido. Trata-se da biografia de um homem importante para a cultura potiguar, por ter sido o pai dedicado do nosso grande Luís da Câmara Cascudo. Uma biografia escrita pela neta do biografado. Tecnicamente bem editado, o livro em papel branco e tipos grandes, é facilitador da leitura pelo leitor mais maduro. O anexo, com material fotográfico apresenta um rico acervo familiar. Pois bem. Sou um leitor fanático de biografias. Sempre que posso, carrego comigo um livrinho com a biografia de alguém interessantee dou preferência a biografias curtas. Não gosto de me embrenhar em calhamaços sobre a vida de alguém. Este livro de Anna Maria tem essa vantagem, não é muito extenso. Outra coisa que em chamou a atenção foi o lúcido ensaio crítico de Tarcísio Gurgel, na introdução do livro. O professor coloca no lugar certo este gênero pouco explorado em terras potiguares. Não pela falta de grandes vultos, mas principalmente pela prosa insípida que é a praga das biografias. Anna Maria tenta fugir deste obstáculo com a confecção de capítulos curtos, bem curtos, em que ela vai traçando um cenário em torno do biografado. Ela começa falando so costumes, depois do comércio local, da política e aos poucos vai traçando um retrato deste homem que tão representou a classe dos homens de negócio no início do séxulo 20 em Natal. O subtítulo desta biografia vem bem a calhar, quando se sabe que o Coronel Cascudo é um pioneiro da imprensa potiguar. Ele fundou um jornal, pensando principalmente em fornecer um canal de expressão para seu filho intelectual Câmara Cascudo. Imagine um espírito inquieto como o do grande folclorista com um jornal na mão, hein? Como empresário o Coronel Cascudo conheceu o apogeu e a queda. A quebra da Bolsa de Valores em Nova York e a crença na honestidade alheia, dilapidaram seu patrimônio financeiro. Mesmo assim, ele continuou altivo, frequenando os ambientes da alta sociedade natalense, querido por todos. Ao contrário da maioria dos biógrafos, Anna Maria optou por uma narrativa não cronológica. Então, a notícia do falecimento do Coronel Cascudo ocorre logo nos primeiros capítulos. Depois ela retoma a ntrajetória do avô, a partir das notícias sobre seus bisavós. A partir daí ela retoma a história da vida de seu avô, sua carreira militar, seus feitos heróicos e utiliza uma boa quantidade de páginas para narrar os acontecimentos na Serra do Doutor. Acrescido de provas documentais e capítulos descrevendo o caráter do homem público, o livro de Anna Maria dá conta do recado. Acho que é mais um apoio para os que estudam ou querem conhecer melhor a vida familiar de Câamara Cascudo. O jornalista e escritor Ticiano Duarte diz no prefácio do livro: “Quando era estudante ginasiano, ouvia falar do Coronel Cascudo, pai de Luís da Câmara Cascudo, da sua fama de homem poderosos e rico, uma espécie de dono da cidade. As sessões do cinema Royal só começavam com a presença do casal Francisco Cascudo – Donana. O mesmo ocorria no cinema Plytheama, na Ribeira, nos áureos tempos de riqueza e progresso no bairro comercial. Francisco Justiniano de Oliveira Cascudo era o seu nome, nascido em 1863, falecendo em 1935. Comerciante, tenente do antigo Batalhão de Segurança, ajudante de ordens do governador Ferreira Chaves, coronel da Guarda Nacional. Políticos, deputado estadual em diversas legislaturas e membro da Intendência Municipal de Natal. fundou e manteve de 1914 a 1937, o jornal A Imprensa. Sua casa comercial era conhecida como a mais sortida no ramo de vendas de louças, ferragens e materiais de construção. Localizada na esquina da Rua Dr. Barata com a praça Ausuto Severo e Travessa Aureliano. O prédio tinha nove portas de entrada e o escritório do Coronel Cascudo, no fundo do estabelecimento, era visitado pelas figuras mais ilustres da cidade, políticos, comerciantes, advogados, médicos. O proprietário fazia questão de receber pessoas humildes que o procuravam, operários, homens do povo que ali iam a busca de apoio e auxílio financeiro. O escritor Thadeu Lemos, que cheguei a conhecer, no Rio de janeiro, conta que o escritório, assemelhava-se a um centro de assistência social. Muitos entravam ali levados por uma necessidade de socorro urgente. E acrescenta o historiador, na apresentação do livro de Luís da Câmara Cascudo, sobre as Velhas Figuras: ‘Coronel Cascudo conhecia todo mundo e aqueles que sabia estarem realmente necessitados, eram atendidos com carinho e sem humilhação’. O testemunho geral é o de que ele foi um homem que usou seu prestígio na política e na sociedade para ajudar os que lhe batiam à porta. Jamais pedia para os seus ou para si próprio. Generoso com todos, dos mais afortunados aos mais pobres. Contava-se do dinheiro que gastava para eleger os amigos políticos. Financiava eleições, como financiava os amigos comuns em dificuldades. Jamais executou devedores, perdoando dívidas de forma perdulária, em prejuízo da própria família. Tinha, no Rio Grande do Norte, perto de 1.200 afilhados, filhos de ricos e de pobres. A sua mansão, famosa, era uma chácara no Tirol, Vila Cascudo. Ali ele recebia os amigos, diariamente, e a visita das figuras mais ilustres da terra. O governador Ferreira Chaves, todos os dias visitava a biblioteca do seu filho, Luís da Câmara Cascudo. Quando a cidade tinha apenas o jornal oficial, A República, Francisco Cascudo fundou um jornal diário, A Imprensa, que circulou durante quatorze anos sob suas expensas. Esse homem de tantas qualidades humanas, um dia empobreceu. Leio com tristeza no arquivo epistolar de Adauto Câmara, organizado por Raimundo Soares de Brito, uma carta ao seu pai, Teódulo Câmara, narrando a saga do velho Cascudo, executado por um credor impiedoso. A questão com o italiano Babini, que segundo o missivista estava sendo desumano com o velho coronel: ‘tudo que Cascudo possui, a casa com todos os terrenos e demais dependências, avaliados em 150 contos’. E acrescenta Teódulo Câmara: ‘E nem um amigo lhe aparece para auxiliá-lo. O mundo é assim. Tanto benefício que ele fez quando se achava bem, para não ver hoje quem lhe estenda a mão amiga’. O velho Cascudo foi político num tempo em que a política não era ainda negócio, nem pé-de-meia para outras arrancadas carreiristas. Thadeu Lemos mesmo desabafa: ‘O cidadão ingressava rico na política e saía pobre’. O exemplo do velho Francisco Cascudo ficou na história, na cidade que ele amou, na memória do povo que ele serviu. Morreu pobre, sem bens e dinheiro, mas deixou um patrimônio que o Rio Grande do Norte inteiro ainda venera: o filho que produziu, para honra e glória de sua terra, Luís da Câmara Cascudo. Fernando Pessoa já tinha dito: Outros homens haverão de ter o que houvermos de perder.” * Carlos de Souza - fcarlos@tribunadonorte.com.br **Publicação da Tribuna do Norte - 25/05/2011 - Toque (Livros & Cultura)

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