Zila germina na tela

A poesia de Zila Mamede ganha contornos oníricos e audiovisuais no curta-metragem “Pegadas de Zila”, selecionado para integrar a mostra competitiva da 21ª edição do Cine Ceará. Com roteiro e direção do potiguar radicado no Rio de Janeiro, Valério Fonseca, e trilha sonora do cantor e compositor Dudé Viana, o filme tece colcha poética de retalhos tendo como protagonista a atriz Rosamaria Murtinho, na pele de uma mulher que revive e passeia pelas memórias da poetisa nascida na Paraíba e criada no Rio Grande do Norte, que sonhava em conhecer o mar. “Pegadas de Zila” tem 11 minutos de duração, foi rodado em Natal e no Rio de Janeiro, e a participação no festival Cine Ceará marca estreia nacional. O evento estará em cartaz no Teatro José de Alencar, entre os dias 8 e 15 de junho, em Fortaleza.
Aurora LeãoA atriz Rosamaria Murtinho, como uma mulher tomada pela poesia de Zila Mamede: “O mar é o grande personagem”A atriz Rosamaria Murtinho, como uma mulher tomada pela poesia de Zila Mamede: “O mar é o grande personagem”
“O projeto existe desde junho de 2010. Quando voltava de um festival de cinema em Jericoacoara, onde fui participar com o curta ‘Maria Ninguém’ (2008), passei por Natal para rever a cidade e comecei a filmar lugares onde passei minha infância”, disse Valério, radicado há quase vinte anos na capital fluminense. “Queria fazer um outro tipo de registro, mas não sabia exatamente o quê. Quando cheguei à Praia do Meio, fiquei encantado com as imagens captadas e, apesar de conhecer pouco sua poesia, Zila Mamede não saía da cabeça – sabia da relação que ela tinha com o mar e de sua morte trágica, em 1985, quando nadava no Rio Potengi. Assim surgiu ‘Pegadas de Zila’”, lembra o diretor. Realizado sem o amparo de leis de incentivo ou editais públicos, o curta-metragem levou cerca de 10 meses para ficar pronto. “Gravamos tudo em quatro dias, externas e internas, e o melhor é que não gastamos quase nada: foi tudo na amizade, tudo por amor mesmo”, comemora Fonseca, que conheceu Rosamaria Murtinho através de uma amiga em comum, a atriz e cineasta cearense Aurora Miranda Leão: “Murtinho era minha primeira opção, é uma atriz maravilhosa, sensível e ajudou muito na realização com ideias geniais. É interessada em trabalhar com projetos de curta-metragem, e se envolveu de maneira especial com a poesia de Zila Mamede, que ela não conhecia”. O tom onírico vem da experimentação do diretor em não se prender a formatos: “Optei por uma abordagem experimental por não ter a pretensão de produzir um documentário nem uma obra de ficção. O mar é um grande personagem no filme, ele nos engole; Rosamaria Murtinho também não interpreta Zila, seu personagem se confunde com a figura da poetisa”, explicou Fonseca, que fecha o filme com o poema “A Ponte”, musicado por Dudé Viana. A ficha técnica ainda inclui still e produção executiva de Aurora Miranda Leão; still em Natal de Letícia Santos, arte de Iziane Mascarenhas, e montagem de Saulo Moretzsohn. O diretor de “Nas Pegadas de Zila” começou sua carreira há mais de 20 anos, no Rio de Janeiro, onde estudou teatro no Tablado e na Casa de Artes Laranjeiras e fez cinema na Escola Darcy Ribeiro. Como curtametragista, produziu curtas “Maria Ninguém” (2008), sobre a passagem de Brigtte Bardot em Búzios (RJ) nos anos 1960 com Fernanda Lima no papel principal; “Chapada”; “Céu de Dor”; “A maldição de Berenice”; e “Dona Eulália”. Com “Maria Ninguém” foi premiado em Los Angeles como melhor curta internacional de 2010. Esta é a segunda vez que uma temática potiguar concorre no festival. Em 2010, o curta “Dona Militana, a romanceira dos oiteiros”, do paulistano Hermes Leal. Poetisa inspira novos olhares Não só a poesia, mas também a faceta pesquisadora e bibliotecária de Zila Mamede vem sendo objeto de um novo olhar. A poetisa Marize Castro também está concluindo dissertação de mestrado sobre o tema. Com o título “O silencioso exercício de semear bibliotecas”, a dissertação será transformada em livro, a ser lançado dia 17 de julho próximo. “A poesia de Zila é muito refinada, e conhecer sua obra e trajetória faz necessário para compreender o próprio desenvolvimento da educação no RN”, adianta a autora. Saiba mais... Paraibana de Nova Palmeira, Zila da Costa Mamede (1929-1985) veio morar no RN ainda na infância. Estudou em Currais Novos e Natal, onde despertou sua verve poética, e, na década de 1950, embarca para o Rio de Janeiro para cursar Biblioteconomia. Após especialização nos Estados Unidos, retorna a Natal onde organiza as principais bibliotecas da cidade: a Biblioteca Central da UFRN (que hoje leva seu nome) e a Biblioteca Câmara Cascudo. A obra e organizou a bibliografia de Cascudo e do pernambucano João Cabral de Melo Neto, e escreveu seu nome na literatura potiguar ao lançar os livros “Rosa de Pedra” (1953); “Salinas” (1958), com o qual ganhou prêmio em Pernambuco; “O Arado” (1959); “Exercício da palavra” (1975); a coletânea “Navegos” e “Corpo a corpo” (ambos de 1978); e a “A herança” (1984)”. Em dezembro de 1985, Zila sentiu-se mal e morreu afogada no Rio Potengi, onde costumava nadar. Yuno Silva repórter www.tribunadonorte.com.br

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